“The simple step of a courageous individual is not to take part in the lie”

                                                                                                   Alexander Solzhenitsyn

Tendo sido prisioneiro político durante o estalinismo e testemunha em primeira mão da tirania soviética, Solzhenitsyn foi também testemunho vivo do poder do indivíduo no combate à tirania, como agente de mudança. Apesar de não faltarem exemplos históricos do poder do indivíduo perante o totalitarismo colectivista, com o crescimento do estado e imposição dos seus tentáculos na vida privada de cada um, bem como a passividade geral para que tal aconteça, a ideia de que o indivíduo ou até da pequena comunidade local como vector de mudança, passou a ser vista de forma pouco popular ou até mesmo obsoleta. Por sua vez, hoje em dia as noções de mudança para os mais diversos problemas na sociedade é usualmente vista à escala global, seja através de medidas estatais ou clamores de ativismos geracionais, sempre sob uma perspetiva colectivista: “Estamos juntos nesta luta (inserir causa) pelo bem comum”.
Não obstante a herança ocidental da noção de que o indivíduo é o princípio e o fim da sociedade seja cada vez mais espezinhada, se prestarmos atenção aos períodos mais sangrentos do séc. XX., seja sob o poder de Hitler, Estaline, Mao, Pol Pot, ou outro ditador qualquer, verificamos com alguma facilidade de que foi sempre com o pretexto do bem do colectivo acima do indivíduo, que foram feitas as maiores atrocidades. Assim, é pacífico afirmar-se perentoriamente, que não há melhor forma de alguém acumular poder e se perpetuar no poder, do que proclamando-se como o salvador e guardião do bem comum. 

Alexander Solzhenitsyn

Como elucidou Albert Camus: 

“The welfare of the people is the alibi of tyrants”.

Dado que no sentido mais lato, o coletivo não passa de um grupo de pessoas, as ideologias coletivas podem ser construídas a partir de um inúmero conjunto de factores (raça, etnia, religião, sexualidade, nação ou até, fazendo o paralelismo para o panorama atual, estado de vacinação, acabando por incidir sempre numa narrativa tribal de “nós vs. eles”.
 Numa das suas obras menos aclamadas, “Theory and History”, Mises explica isto mesmo:

“There is no uniform collectivist ideology, but many collectivist doctrines. Each of them extols a different collectivist entity and requests all decent people to submit to it. Each sect worships its own idol and is intolerant of all rival idols.”

Ludwig Von Mises

Apesar disto, atualmente, a ideia de mudança social ainda é vista como resultado de uma qualquer ação coletiva e a noção enfática no indivíduo é tida como egoísta e de todo desconsiderada como factor de mudança.
Embora a cooperação entre diferentes grupos de pessoas, para atingir um determinado fim seja um aspecto importante para a mudança social, esta será ineficiente na luta pela liberdade se as pessoas não lutarem por um processo de crescimento individual e de libertação dos mecanismos de doutrinação vigentes e deste modo, se mantiverem alienadas para a realidade.
Sendo o ser humano um ser social é inquestionável a necessidade de associação e comunidade, porém, quem pretende ter poder não quer que a noção de comunidade fique reduzida a uma esfera reduzida de associação (família, igreja, organizações privadas etc.), mas a um coletivo específico que engloba uma comunidade a um nível macro; o guardião deste coletivo tem sido o estado nação cada vez menos soberano e relegando o seu poder para instituições supranacionais e burocratas não eleitos. Independentemente da realidade particular de cada geografia ou comunidade: para problemas globais, soluções globais…
É aqui que a doutrinação e a propaganda institucional assumem um papel preponderante na para quem está no poder e onde a dependência neste putativo “guardião do bem comum” gradualmente se degenera em tirania e supressão da liberdade individual, tudo sempre em nome de um bem colectivo. A capacidade de induzir nas massas a ideia de supremacia do colectivo em detrimento do indivíduo e da dependência deste mesmo colectivo no estado, revela-se crucial para a criação de um regime tirânico e na manutenção do controlo sobre a população. 

Jung considerou este processo semelhante ao processo de transformação da sociedade em gado ovino:

“The increasing dependence on the State is anything but a healthy symptom; it means that the whole nation is in a fair way to becoming a herd of sheep, constantly relying on a shepherd to drive them into good pastures. The sheapherd´s staff soon becomes a rod of iron and the sheperds turn into wolves”  – in Civilization in Transition

Não faltando exemplos históricos, na Coreia do Norte durante a grande fome dos anos 90 ou na União Soviética sob o regime de Estaline, além das populações estarem oprimidas, passarem fome e estarem na sua grande maioria desarmadas, os governantes terem e manterem à sua disposição forças policiais massivas, redes de espionagem, campos de concentração e sistemas prisionais robustos, a repressão por si só nunca foi suficiente, tendo havido sempre a necessidade de fazer uso de propaganda massiva para glorificar o coletivo e legitimar-se como garante do bem do colectivo; Evidenciando assim que um regime tirânico só se mantêm no poder se tiverem como controlar as mentes dos cidadãos. Assim que se torna perceptível que ganhar o controle das mentes dos indivíduos é um dos meios mais vitais para controlar uma população, fica também claro que o primeiro passo para combater a tirania é passar pelo difícil processo de libertação da própria mente da propaganda que nos rodeia sob pena de se não o fizermos iremos ser coniventes com a mentira engradecendo a tirânia. 

Jordan Peterson explica este processo em Maps of Meaning:

 

“Our petty weaknesses accumulate, and multiply, and become the great evils of state. As our technological power expands, the danger we pose increases – and the consequences of our voluntary stupidity multiply. It is increasingly necessary that we set ourselves – not others – right, and that we learn explicitly what that means.”

Jordan Peterson

 

Embora sejamos levados a acreditar que o indivíduo é impotente na presença dos grandes problemas sociais que enfrentamos hoje, a verdade é que o indivíduo é muito mais poderoso do que comumente se acredita. Aquele que libertou a sua mente, endireitou-se e em busca da verdade não tem medo de falar ousadamente o que pensa, mesmo perante uma oposição severa, nas palavras de Jung “sem saber e involuntariamente tornou-se um líder” – um modelo que outros naturalmente se esforçarão para imitar. Num mundo de propaganda e mentira isto assume cada vez mais preponderância como factor de mudança, um indivíduo assim, será um peão a menos num sistema opressor e mesmo que involuntariamente terá assumido um papel crucial na regeneração da sociedade.

Como Jung observou em Civilization in Transition:

 

“The psychology of the individual is reflected in the psychology of the nation…Only a change in the attitude of the individual can initiate a change in the psychology of the nation. The great problems of humanity were never yet solved by general laws, but only through regeneration of the attitudes of individuals.” (Civilization in Transition, Carl Jung)

 

Carl Jung

Ao contrário daqueles que pregam os valores do coletivismo, focar-nos em corrigirmo-nos individualmente antes de colectivamente, não deve, portanto, ser considerado como um acto de egoísmo ou de alienação da sociedade. Pelo contrário, aqueles que se corrigem e libertam suas mentes da doutrinação do Estado prestam um grande serviço a si mesmos e através do seu exemplo aos outros que o rodeiam. Enquanto seres humanos, todos nós enfrentamos lutas similares e, portanto, aqueles que encontram soluções para si próprios atuam como modelos para outros membros da sociedade.

Com isso em mente, deve ficar claro o papel crucial que os indivíduos devem desempenhar na criação de um mundo livre. Numa sociedade dominada por governos opressores, o que se revela crucial são exemplos que sejam testemunho vivo do que significa ser livre. Sem indivíduos assim, nenhuma ação coletiva, nenhum movimento de massa, nenhuma eleição de um novo líder que prometa “mudança” trará alguma coisa além de um alívio temporário e superficial.

Já Nietzsche tinha afirmado categoricamente: 

“os homens autossuficientes, independentes e sem preconceitos são os pilares de uma civilização forte”.

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